terça-feira, 10 de julho de 2012

As Veias Abertas da América Latina...


Adam Smith dizia que o descobrimento da América tinha “elevado o sistema mercantil a um grau de esplendor e glória, que de outro modo não seria alcançado jamais”.
Segundo Sergio Bagú, o mais formidável motor de acumulação do capital mercantil europeu foi a escravatura americana; por sua vez, esse capital tornou-se a “pedra fundamental sobre a qual se construiu o gigantesco capital industrial dos tempos contemporâneos”. A ressurreição da escravatura greco-romana no Novo Mundo teve propriedades milagrosas: multiplicou as naves, as fábricas, as ferrovias e os bancos de países que não estavam na origem nem, com exceção dos Estados Unidos, no destino dos escravos que cruzavam o Atlântico. Entre os albores do século XVI e a agonia do século XIX, vários milhões de africanos, não se sabe quantos, atravessaram o oceano; sabe-se, sim, que foram muito mais que os imigrantes brancos, provenientes da Europa, embora, está claro, muito menos sobreviveram. Do Potomac ao rio da Prata, os escravos edificaram a casa de seus amos, abriram as matas, cortaram e moeram cana-de-açúcar, plantaram algodão, cultivaram o cacau, colheram o café e o tabaco, afogaram se nos socavãos mineiros. A quantas Hiroximas equivaleram seus extermínios sucessivos? Como dizia um plantador inglês de Jamaica , - “os negros, é mais fácil comprá-los do que criá-los”. Caio Prado Júnior calcula que até o princípio do século XIX havia chegado ao Brasil entre cinco a seis milhões de africanos; por esta época, Cuba já era um mercado de escravos tão grande como o havia sido, antes, todo o hemisfério ocidental.

Por volta de 1562, o capitão John Hawkins tinha arrancado 300 negros de contrabando da Guiné portuguesa. A rainha Elizabete ficou furiosa: “Esta aventura - sentenciou - clama vingança do céu.” Porém, Hawkins contou-lhe que no Caribe havia obtido, em troca dos escravos, um carregamento de açúcar e peles, pérolas e gengibre. A rainha perdoou o pirata e converteu-se em sócia comercial dele. Um século depois, o duque de York marcava a ferro quente suas iniciais, DY, sobre a nádega esquerda ou o peito dos três mil negros que sua empresa conduzia anualmente para “as ilhas do açúcar”. A Real Companhia Africana, entre cujos acionistas figurava o rei Carlos II, dava 300% de dividendos, apesar de que, dos 70 mil escravos que embarcaram entre 1680 e 1688, só 46 mil sobrevivessem à travessia. Durante a viagem, numerosos africanos morriam vítimas de epidemias ou desnutrição, ou se suicidavam negando-se a comer, enforcando-se com suas correntes ou lançando-se pela borda ao oceano eriçado por barbatanas de tubarões. Lenta, porém firmemente, a Inglaterra ia quebrando a hegemonia holandesa no tráfico negreiro.
A South Sea Company foi a principal usufrutuária do “direito de asiento” concedido aos ingleses pela Espanha, e nela estavam envolvidos os mais proeminentes personagens da política e das finanças britânicas: o negócio, brilhante como nenhum outro, enlouqueceu a bolsa de valores de Londres e deflagrou uma especulação legendária.'

Eduardo Galeano, in As Veias Abertas da América Latina. De esquerda ou de direita, não importa: recomendo a leitura. 
Pode ler aqui: http://copyfight.noblogs.org/gallery/5220/Veias_Abertas_da_Am%C3%83%C2%A9rica_Latina(EduardoGaleano).pdf

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