segunda-feira, 16 de abril de 2012

Como combater a corrupção



ALBERTO CARLOS ALMEIDA
Em 2011, vários movimentos de combate à corrupção ganharam as ruas do Brasil. A maioria deles protagonizada por jovens universitários da nova geração que – praticamente para tudo – se comunica por meio de mensagens de texto de celulares e pelas redes sociais. Esses jovens cresceram num país com inflação controlada e com a percepção crescente de que uma política social eficaz vem combatendo com sucesso a pobreza e a desigualdade. Portanto, apareceram com mais força problemas antigos que, por isso mesmo, se tornaram problemas novos.
A corrupção é antiga no Brasil. A grande novidade é que ela ficou mais visível. Ficar mais visível é condição necessária para que seja combatida. É impossível atacar um inimigo invisível.
Ela ficou mais visível, em primeiro lugar, porque se tornou arma de ataque na briga entre os políticos. Nada mais importante para combater a corrupção que a competição política. Como há dois ou mais partidos em permanente luta pelo poder, eles farão de tudo para enfraquecer seus adversários. As denúncias de corrupção têm esse importante papel.
Deixemos de lado o argumento moralista, aquele que critica o denunciante porque ele faz o que faz movido pelo interesse próprio. É assim mesmo que funciona. No episódio do mensalão, se o então deputado Roberto Jefferson não tivesse sido contrariado em seu interesse próprio, jamais iria à mídia denunciar o esquema de compra de votos de deputados. Devemos louvar o interesse próprio quando ele vier combinado com conflito e competição. Sem isso, jamais saberíamos de muitas das falcatruas que ocorrem na administração pública brasileira.
O segundo motivo que levou a corrupção a ficar mais visível – na verdade, o mais importante de todos – é a mudança na cabeça dos brasileiros. Estamos passando por um contínuo e ininterrupto processo de melhoria da escolaridade de nossa população. Há uma relação simples e direta amplamente comprovada por dados de pesquisas: quanto mais elevada for a escolaridade de uma pessoa, mais ela se importará e tenderá a ser contra a corrupção. Portanto, a cada ano que passar, os brasileiros ficarão mais indignados com os escândalos e as denúncias de corrupção.
Na luta pelo poder, os políticos denunciam seus adversários – e graças a isso sabemos das falcatruas 
É somente por causa disso que os políticos podem usar tais denúncias como arma de guerra. Em consequência, com o permanente aumento da escolaridade da população, veremos em paralelo um permanente aumento do uso de escândalos e denúncias como arma para derrubar e prejudicar os adversários.
O terceiro fator-chave para o aumento da visibilidade da corrupção é a liberdade de imprensa. Uma imprensa dependente do governo para sua sobrevivência financeira jamais publicaria fatos que viessem a prejudicar os governantes. Igualmente, uma imprensa controlada por uma mesma elite política que tivesse relações pessoais e de parentesco muito próximas também dificilmente daria publicidade a fatos que denegrissem os ocupantes do governo.
Uma elite mais ampla, em que as pessoas não tenham sido criadas juntas, estudado nas mesmas escolas e faculdades ou frequentado os mesmos círculos sociais, é fundamental para que haja liberdade de imprensa. Primeiro é preciso pluralismo, depois vem o exercício da liberdade.
Políticos atacam políticos e a imprensa divulga. No dia seguinte, milhares de jovens vão às ruas mostrar indignação. Sua grande frustração é que não têm o poder real de combater a corrupção. Basta procurar um pouco para encontrarmos dezenas ou centenas de depoimentos desses jovens afirmando que, ao final dos protestos, fica a sensação de impotência, fica o sentimento de que nada mudará porque os protestos em si não interferem no dia a dia das práticas ilícitas. Protestar e mobilizar a sociedade é fundamental para tornar o problema visível, mas não pune os políticos corruptos.
LANTERNA O senador José Sarney. Segundo um estudo acadêmico, seu Estado, o Maranhão, é o que tem as instituições de controle mais fracas na política brasileira (Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A. Press)
Os dois tipos possíveis de punição são o eleitoral e o judiciário. A punição eleitoral, mostramos isso num artigo anterior neste mesmo espaço, vem ocorrendo gradativamente. É graças a ela que figuras como Maluf e Quércia foram precocemente sepultadas como políticos de grande poder e influência. Eles são dois dentre inúmeros exemplos que existem em todos os cantos do Brasil.
A maior arma contra a corrupção é a existência de instituições que efetivamente a combatam. Mídia e opinião pública são instituições, porém não é a elas que me refiro, mas sim a Ministério Público, Justiça, Tribunais de Contas, Tribunais Regionais Eleitorais, a Agências Reguladoras, leis, departamentos de ensino e pesquisa em nossas universidades que estudem fraudes, ao Conselho Nacional de Justiça, a procuradorias, corregedorias etc.
A importância da ação dessas instituições está comprovada cientificamente pelo artigo de Lee Alston, Marcus Melo, Bernardo Mueller e Carlos Pereira intitulado The predatory or virtuous choices governors make: the roles of checks and balances and political competition. Usando dados de cada um dos Estados do Brasil, os autores mostram que, quanto mais ativas são essas instituições, menos os políticos do respectivo Estado enriquecem; menor é o gasto com pessoal como proporção da receita do Estado; e menor é o deficit primário daquela unidade da Federação. Eles provam que a interação entre Poder Judiciário ativo, Tribunais de Contas atuantes, procuradores públicos militantes, com o auxílio da mídia local e da opinião pública, são imbatíveis quando se trata de limitar a margem de manobra dos políticos no uso do dinheiro público. A lição é clara: quem quer combater a corrupção precisa apoiar o fortalecimento das instituições que controlam o poder dos políticos.
Os cinco Estados que têm as instituições de controle mais fortes são Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e São Paulo. O lanterninha é o Maranhão de Sarney, antecedido por Roraima, Rio Grande do Norte, Piauí e Alagoas. Isso mostra que as famílias Sarney e Collor não são fenômenos isolados, que pairam sobre o mundo sem ligação alguma com suas instituições. Pelo contrário, os Sarneys só existem porque, em seu Estado, não foram desenvolvidas as instituições que os combateriam. 

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